François, Nicolas, Madeleine, Cardeal Morlot - Paris, 1863
8. A virtude, no seu mais alto grau, é o conjunto de todas as
qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Ser bom, caridoso, laborioso,
sóbrio, modesto, são qualidades do homem virtuoso. Infelizmente são
acompanhadas quase sempre de pequenas falhas morais que as desmerecem e as
enfraquecem. Aquele que faz alarde de sua virtude não é virtuoso, pois lhe
falta a principal qualidade: a modéstia. E tem o vício mais oposto: o orgulho.
A virtude realmente digna desse nome não gosta de se exibir; ela é sentida, mas
se esconde no anonimato e foge da admiração das multidões. São Vicente de Paulo
era virtuoso; o digno Cura de Ars era virtuoso, e muitos outros não muito conhecidos
do mundo, mas conhecidos de Deus. Todos esses homens de bem ignoravam que eram
virtuosos; deixavam-se ir pela corrente de suas santas inspirações e praticavam
o bem com total desinteresse e completo esquecimento de si mesmos.
À virtude, assim compreendida e
praticada, é que eu vos convido, meus filhos; a essa virtude verdadeiramente
cristã e verdadeiramente espírita que eu vos convido a consagrar-vos. Afastai
de vossos corações o sentimento do orgulho, da vaidade, do amor-próprio, que sempre
desvalorizam as mais belas qualidades. Não imiteis o homem que se coloca como um modelo e se gaba de suas próprias qualidades para
todos os ouvidos tolerantes. Essa virtude com ostentação esconde, muitas vezes, uma multidão de pequenas
mesquinharias e odiosas fraquezas.
Em princípio, o homem que exalta a si mesmo, que
ergue uma estátua à sua própria virtude, aniquila, por essa única razão, todo
mérito efetivo que possa ter. Mas o que direi daquele que dá valor em parecer aquilo
que não é? Compreendo muito bem que o homem que faz o bem sinta no fundo do
coração uma satisfação íntima, mas, uma vez que essa satisfação se exteriorize
para provocar elogios, degenera em amor-próprio.
Vós todos, a quem a fé espírita reanimou com seus
raios, e que sabeis o quanto o homem está longe da perfeição, não façais nunca uma
tolice dessas. A virtude é uma graça que eu desejo a todos os espíritas
sinceros, mas advirto: Mais vale poucas virtudes com modéstia do que muitas com
orgulho. Foi pelo orgulho que as humanidades se perderam sucessivamente, e será
pela humildade que deverão um dia redimir-se.
JESUS E HUMILDADE
Reunião pública de 9/3/59
Questão nº 937
Estudando a humildade, vejamos como se comportava
Jesus no exercício da sublime virtude.
Decerto, no tempo em que ao mundo deveria surgir a
mensagem da Boa-Nova, poderia permanecer na glória celeste e fazer-se
representar entre os homens pela pessoa de mensageiros angélicos, mas preferiu
descer, Ele mesmo, ao chão da Terra, e experimentar-lhe as vicissitudes.
Indubitavelmente, contava com poder bastante para
anular a sentença de Herodes que mandava decepar a cabeça dos recém-natos de
sua condição, com o fim de impedir-lhe a presença; entretanto, afastou-se
prudentemente para longínquo rincão, até que a descabida exigência fosse
necessariamente proscrita.
Dispunha de vastos recursos para se impor em
Jerusalém, ao pé dos doutores que lhe negavam autoridade no ensino das novas
revelações; contudo, retirou-se sem mágoa em demanda de remota província, a
valer-se dos homens rudes que lhe acolhiam a palavra consoladora.
Possuía suficiente virtude para humilhar a filha de
Magdala, dominada pela força das sombras; no entanto, silenciou a própria
grandeza moral para chama-la docemente ao reajuste da vida.
Atento à própria dignidade, era justo mandasse os
discípulos ao encontro dos sofredores para consolá-los na angústia e sarar-lhes
a ulceração; todavia, não renunciou ao privilégio de seguir, Ele mesmo, em cada
canto de estrada, a fim de ofertar-lhes alívio e esperança, fortaleza e
renovação.
Certo, detinha elementos para desfazer-se de Judas,
o aprendiz insensato; porém, apesar de tudo, conservou-o até o último dia da
luta, entre aqueles que mais amava.
Com uma simples palavra, poderia confundir os
juizes que o rebaixavam perante Barrabás, autor de crimes confessos; contudo,
abraçou a cruz da morte, rogando perdão para os próprios carrascos.
Por fim, poderia condenar Saulo de Tarso, o
implacável perseguidor, a penas soezes, pela intransigência perversa com que
aniquilava a plantação do Evangelho nascente; mas buscou-o, em pessoa, às
portas de Damasco, visitando-lhe o coração, por sabê-lo enganado na direção em
que se movia.
Com Jesus, percebemos que a humildade nem sempre
surge da pobreza ou da enfermidade que tanta vez somente significam lições
regeneradoras, e sim que o talento celeste é atitude da alma que olvida a
própria luz para levantar os que se arrastam nas trevas e que procura
sacrificar a si própria, nos carreiros empedrados do Mundo, para que os outros
aprendam, sem constrangimento ou barulho, a encontrar o caminho para as bênçãos
do Céu.
Livro Religião dos Espíritos – Emmanuel – Chico Xavier.
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